
Aqui conto um pouco sobre o processo de criação das ilustrações com tecido para a coleção Monteiro Lobato, com adaptação de Silvana Salerno e Fernando Nuno, da Editora do Brasil.
A Emília foi feita pela tia Nastácia com retalhos de tecidos. A ideia do retalho, metamorfosear sobras em matéria-prima, me agrada muito e foi o caminho que escolhi para criar as ilustrações. Uma espécie de homenagem à tia Nastácia. Foi, portanto, numa loja de tecidos que montei a paleta de cor. Meus lápis foram os fios, arremates e tesoura. Minhas tintas foram os tecidos variados que, desfiados e cortados, se transformaram em vida. Escolhi tecidos de puro afeto, com estampas, transparências e rendas que nos dão novo significado sendo rios, árvores, personagens.


Escolhi duas paletas de cores diferentes para cada livro. O contexto do livro Viagem ao céu pedia cores mais escuras. Além do mais, os personagens mudaram de roupa de um livro para o outro.
Capa
Cortei os tecidos e montei as ilustrações em tamanho natural. Com a ajuda de uma máscara com o formato do livro, me guiei para seguir as proporções do rafe das ilustrações, feitos anteriormente à lápis. O lettering da capa foi inserido depois, digitalmente.




Corte e recorte
Montei os personagens diretamente nos cenários, quando possível. Quando os personagens entram muito pequenos na cena, fiz separadamente para depois diminuí-los no computador e aplicá-los na cena. O corte com a tesoura não comportou os detalhes quando tentei fazer os personagens pequenos.




Os tecidos não foram colados para que garantissem o volume e a sombra desejados. Depois de montadas, as ilustrações foram fotografadas, tratadas e finalizadas no computador.


Projeto gráfico
Busquei referências visuais das obras de Lobato, desde o tempo dos chamados “livros escolares”. Eram pequenos livros com histórias que ele escreveu e que, mais tarde, foram reunidos num só volume: Reinações de Narizinho, em 1931. Cito algumas referências que encontramos nesse projeto como, por exemplo, o formato. Nosso livro é maior, mas mantém a mesma proporção dos livros escolares. Possui captulares desenhadas, que são também narrativas. Nos textos iniciais e finais usei moldura e adornos, próprios do estilo art deco, assim como na tipografia. Tudo isso são referências, no entanto, como o próprio nome diz, referência é o ato de contar. E assim, ganho a liberdade de contar, à minha maneira, o clássico com uma linguagem contemporânea.







Esse post por um momento pareceu até uma conversa. Na minha cabeça vinha “como será que essa parte foi resolvida?” e bam! vinha o texto com a resposta (se era escala 1:1, sobre prender as figuras e como utilizar depois…)
Os livros ficaram únicos! É incrível como eles fugiram do lugar comum em vários aspectos (da estética geométrica do modernismo brasileiro, de paletas de cores saturada/vibrante comuns em livros infantis, e ainda, de estilos de colagem — ver o tecido de chita, a renda e o feltro ambientaram demais o cenário brasileiro, pelo menos como um cotidiano bem mais tangível).
P.S.: Adorei que o dragão ocupa dois quadrados na galeria de personagens; De como a Emília é marcante no meio de retalhos, essa paleta ficou demais! E por fim de P.S., achei um mimo o logotipo da editora do Brasil também ser em tecido recortado.
bjs
Que bom te ver por aqui, querida Ceci! Era essa intenção, uma conversa mesmo. E você tem toda razão sobre a escola das chitas como referência do nosso país. Adoro o seu olhar! Um beijo.
Encantada, Raquel, com seu processo de criação e sua experimentação técnica. É uma marca do seu trabalho a liberdade para buscar novos materiais, ousar na elaboração das imagens e dos arranjos gráficos. Torcendo pelas premiações dessas novas produções!
Simone querida, muito bom trocar com você! Grande beijo.